21.1.06

Helena espera resposta de Pedro, Pedro diz:

- É de se dizer que em pantanos encontrarei o dia quente, lama e água leitosa que chupa os pés pra debaixo da terra mole. Não é que não acredite, é que não confio na hipótese. Prefiro muito mais acreditar na bala solta que atravessa enviesados sinais de concreto pela cidade maravilhosa à me acertar o peito vazio. Assim tudo fica mais sólido e palpável podendo ainda me livrar do vazio que a tua ausência causa.

16.1.06

Sobre "Cidade Baixa" e "Cinema, aspirinas e urubus"

Esse arroste comparado do que é um ator dentro do filme, sua movimentação e sua expressão, faz do exercício um aprendizado. Cidade Baixa, em título, anuncia com presteza: são três personagens de destaque, um preto, um branco e uma puta. Todos inseridos num espaço da cidade habitualmente muito mais freqüentado, cheio de tipos e vida. Essa área entre mar e terra limita a movimentação. Já a expressão, que não se pretende limitar ao espaço, dele se influencia. Lázaro Ramos, Wagner Moura e Alice Braga atestam a seus personagens, sobre as veias do cenário-espaço, um punhado de realidade. Com certeza a movimentação e expressão são assuntos de mesma matéria, não se diz de um sem dizer do outro. A movimentação entre barco e terra dá a indicação do tipo de expressão e vice-versa.

O movimento quase que siamês entre os dois habitantes da cidade e do mar é prenuncio de um comportamento que se exprime através da amizade. Seja no espaço reduzido do barco, onde dividem o leme, ou no espaço sujo da cidade onde andam pelos bares e ruas. Toda movimentação se faz sorrateira e afetuosa com toques sinceros e palavras desmedidas de amor. A puta entra em cena e só faz romper entre os dois amigos. A carona inusitada de barco até a cidade maior enceta a separação dos aliados e diminui o espaço de ação dos personagens que agora o dividem com a moça. Toda expressão fica, nesse momento, mais tensa e tênue e chega à separação traumática que no fim se preza resolver com as mãos e pano “daquela” sobre os dois “irmãos”.

Cinema, aspirinas e urubus encena um nordeste que se esfria de dia e esquenta de noite. Peter Ketnath e João Miguel representam através de suas expressões o reflexo direto da ocupação física-espacial de seus personagens, o sertão da Paraíba. Ao contrário de Cidade Baixa a movimentação, aqui, alcança os ares secos de um nordeste impiedoso. Todo o eixo de movimento dos atores se dá em torno da amizade que acaba de nascer. A diferença natural de Johann e Ranulpho se mostra evidente nos diálogos rápidos e curiosos que aproximam pouco a pouco os personagens. A separação, tema de destaque nos dois filmes, não se iguala. Enquanto Cidade Baixa evoca um rompimento mais visceral e problemático o filme de Marcelo Gomes encara o fato com simplicidade. Cinema, aspirinas e urubus encarna um filme de estrada, de percurso. Personagens que pretendem um rumo na vida e o fazem, acompanhados ou não. O alemão fugido da guerra e o nordestino preconceituoso de si mesmo se encontram num espaço que incita a reflexão e ajuda na compreensão de um e de outro, pelo outro. É que se vê num personagem um pouco do outro, apesar das diferenças culturais, e isso renasce como um grão que “primigera” a sensação de múltiplas possibilidades. O personagem sertanejo fortalecido com o prestígio alcançado pela máquina cinema de vender pílulas derruba até o coronel, já com chifres e sem moral. O personagem estrangeiro, ausente de um espaço que lhe sirva, se movimenta em busca de um lugar onde isso possa acontecer. No fundo, são dois seres, que se cruzam e se vão impregnados um do outro pela experiência de contacto. Em Cidade Baixa esse convívio parece não ter fim e faz qualquer ânsia de separação virar um batalha regada a sangue e muita euforia. Por fim, Cinema, aspirinas e urubus e Cidade Baixa apresentam-se em imagens corridas e sons ao espectador uma vontade que se diferencia assim: o primeiro vai de leve, manso; o segundo vai pesado, inabalável.

Sobre hegemonia e dominância no "cinema clássico"

É hegemônico ou dominante por que excede outros tipos de cinema. Daí, por em causa uma questão: quais são esses “tipos”? É inevitável antes dizer, descrever com palavras no papel, material tão apto a ser impregnado de poesia e de sonhos, como a própria película, do que eu acho que aprendi, durante as aulas, que seja o “cine” clássico narrativo.

Oras, creio que a organização cronológica linear dos acontecimentos é o que há de mais estrutural e firme num cinema que opta por uma narrativa de orientação, universal, totalmente compreensível e sem ambigüidades.Está aí: é um cinema que guia, um cinema essencial, transparente, apelativo e transcendental no que diz respeito as barreiras da raça, religião, sexualidade, classe social, nação e quiçá espécie. Um cinema de essência, de mimese. É por esse caminho que se torna modelo, um exemplo de sucesso para outros que viriam, o clássico! Deste modo, a clareza imposta pelo modelo de narrativa permite a existência do filme clássico como um eixo, uma toada afirmada e introduzida pela cultura norte-americana. Os meios que se utiliza para alcançar a clareza necessária são bem interessantes. É uma luta interna para se dissimular enquanto discurso, iludir a sua artificialidade através de técnicas de continuidade, produzindo uma narração invisível, algo natural, traço essencial do “cine” clássico narrativo. Faz-se vital assim, a existência de regras. São elas que sustentam o modelo e que também limitam a criação individual, ou seja, fazem do diretor um evidente empregado dos grandes estúdios. É estilo “mais ou menos” homogêneo, presente através de décadas, estúdios, indivíduos e gêneros. Tudo que é posto em cena(mise-en-scène): atores, iluminação, cenografia, figurino, maquiagem, câmeras etc. se une, de forma orgânica na tentativa de se imprimir um cunho de verdade ao que é meramente moral. Tudo isso calcado numa lógica de causa-efeito.

Quanto aos outros “tipos” é que se diz daquilo que acontece em volta de um rio principal: a margem. Estão a margem deste cinema clássico sem, contudo, possuir menor valor. São “cines” que rebentam contra a tórrida corrente do clássico e assumem sua forma nas mais diversas tendências de cada fase. O Expressionismo Alemão, o Realismo-Poético Francês ou o Neorealismo Italiano seguem incorporando elementos estéticos de outras artes e das escolas da poesia e da pintura. São obras pessoais e subjetivas, marcadas pelo experimentalismo e por inovadoras pesquisas formais, mas distantes do sistema que é dominante, hegemônico: clássico.


14.1.06

A todos aqueles que me querem mal.

Ávida terra onde piso.
Sorte o espaço que me tem livre.

Amor e Flor, tudo na pele.

Eu não sei de quem gosto.
Poeira, asfalto frio e silêncio...
Eu sei bem que não sei.
Sombra e ela...
O machado afiado com lágrimas é atroz ao vento seco desmedido de Cavalcanti que odeia Jean, o macho avassalador filho dos pincéis atômicos de Pierre que hoje seca em óleo sobre as paredes de França, cidade-idéia, num tempo de mistura global. O feitiço oriental sem vergonha e nervoso que espalha o "que" que não é suave ao contrário do chute de pelé aos três postes do campo que um dia foi cemitério de corpos vazios maltratados pelas mães impiedosas e doces como Fellini em tudo e nada de um colorido ausente. A câmera lenta subtrai o texto que é mudo e depois não ouve o que se possa expressar a não ser pra si mesmo um truque da vida que é sua e de todos. O javali de pernas curtas avança sobre a peste entorpecida pelas carnes imundas do homem, ser...que vive a andar com a cabeça e os cabelos são pés e os pés nunca foram nada e as juntas juntadas não dão em nada que vire sexo ou beijo crioulo em sapos sem braços que não flertam lagartos rígidos do sul da Korea que produz bandeiras em tons claros para seus habitantes seres humanos como um índio qualquer ou rinocerante sem chifre que seja o único que floresce quando deita no chão e o rio caudaloso está prsente em cada um que prediz alguma coisa e come...bucetas não dogmáticas e livres, livres dos excessos da vida cheia de nada da empregada neurótica e do jogador boneco de meias do homem adulto feio de si e de nada adianta o adianto no fim do mês de um tempo preso entre cercas de números lentos e curvas totais.
Eu arranjo os passos.
Luz, máquina e natureza...
Eu escovo os pêlos da tirânia.
Grade, grade e grade...
Eu já não vejo ou sinto.
Estrepe, fumaça e rã...
Eu e o fechar dos olhos:
Chocalho de bolhas de sabão em travessas de madeira velha sem risos.
Tcha. Tcha. Tcha.

12.1.06

Início..de tudo.

Interior (casa,escada) - Noite

Homem nu fumando um malboro velho.

Renas Man

Teoria e Linguagem

Comparar e contrastar:
Montagem e forma narrativa..
Movimentação e expressão de atores..
Filho de Deus!
Me diz qual pergaminho rosa é esse?
Aquele da segunda prateleira?
Ou o da última estante no fim do túnel?
Enfim..
Bú.

City Low

Essa orgia descompassada entre luz e sombra.
Um é preto..
Outro é branco..
A seguinte é um "mix" de um e de outro.
No fim..
Só poderia ser assim..
Entre sangue e pano..
As mãos daquela sobre os dois mandarins.

Narrativas quaisquer

Essa matemática..
Em exercícios lentos de narrativa!
Qual é?

É como o baile..
É como a pisada firme de um cavalo andaluz!
Qual é?

É guerra de Ruy!
É solitário!
É?Ou não é.

11.1.06

Sobre “A Noite Americana”


“La Nuit Américaine” é nome que diz de uma cena noturna filmada de dia com um filtro especial, em americano: “Day for Night”. O que significa o título da fita cinematográfica?O reconhecimento de que o cinema americano inspirava Truffaut ou, por outro lado, um anúncio dos vários artifícios usados por um diretor para intensificar a sensação de realidade nas filmagens.

O fato é que a imagem e som da fita são apaixonantes. O estilo simples em retratos caprichados de som diz do “filme dentro do filme” um troço cheio de amor. Um avulso, franco desejo de justapor o drama real (off set) e o drama banal (on set). Diz-se do elenco para uma das razões do sucesso do filme, são eles: Jean-Pierre Léaud, famoso entre os fãs de Truffaut por já ter participado em “Os incompreensíveis” e “As duas Inglesas e o Amor”; Jean-Pierre Aumont, no papel de Alexandre, que também atuou em grandes estúdios americanos; Jaqueline Bisset, linda; Jean-François Stevenin, fez o assistente de direção e realmente assistiu Truffaut nas filmagens; Nathalie Baye, ex-dublê, faz Joelle a colaboradora: lúcida, leal e amante do que faz; Alexandra Stewart, faz a atriz grávida Stacey; Valentina Cortese, faz Severine, a toda vulnerável atriz que envelhece. Aliás, a falta de memória da personagem Severine possibilita a Truffaut a filmagem de uma cena por diversos pontos de vistas, cada vez que a cena é vista, devido aos erros de fala da “atriz-personagem”, a câmera assume uma posição diferente trazendo a realidade de se rodar um filme por várias perspectivas, mas principalmente àquela que trespassa de um filme a outro.

Mais importante ainda é o papel do próprio Truffaut como diretor do filme dentro filme. É a segunda vez que Truffaut atua em um de seus filmes, a primeira foi em “Garoto Selvagem”. Truffaut era um perfeccionista não dogmático, nunca dava ordens, só pedia. Os toques sutis extraiam grandes interpretações e colaborações da equipe. Faz Ferrand como se fosse o próprio Truffaut fazendo a si mesmo, consumido pelas filmagens, a ponto de não ter vida própria. Assim, começamos a assistir ao filme “La Nuit Américaine” supondo que seja a história que iríamos ver até ouvirmos a palavra “corta”. É daí em diante que percebemos que assistiremos a feitura do que pensávamos ser a história. Da história contada passamos ao contar de uma história, privilegiados de espiar os bastidores e ver como um filme é feito. Sem teorias complexas, sem teorias. Nos estúdios La Victorine, num velho set abandonado por razões “capitais”, Truffaut encontra o espaço físico que completaria seu imaginário e lançaria um filme sobre o filme, único.

6.1.06

Pessoas e eu.

Que divertido..
Todas as pessoas de diversas maneiras gritam!
Ao vazio.
As pernas imóveis anunciam o travo final!
São gritos involuntários de saber..
O vídeo GAME!
It´s not over!
Os dedos apontados anunciam o virtual..
E The Doors soa como um assobio alheio a tudo..